“Não vamos votar por causa da crise?”
Com discurso severo, vereador lamenta
adiamento na votação do feriado da Consciência Negra, motivado por questões
econômicas. “Que não seja apenas um jogo político de
desumanidade”
Duas
semanas depois ser aprovado por unanimidade, o Projeto de Lei nº 7098/2014,
que cria o feriado para a Consciência Negra foi barrado durante a apreciação em
segundo turno. A motivação veio de uma consulta pública realizada na tarde
desta segunda-feira (04), na qual os participantes, em sua maioria,
comerciantes, questionaram o impacto da proposta para o setor. A esfera
econômica superou a social e o projeto recebeu um pedido de vistas e só será
debatido novamente na semana que vem. Ao ocupar a tribuna, o vereador Mauricio
Tutty, autor do projeto, agradeceu o apoio dos colegas que se posicionaram
favoráveis ao feriado e lamentou o retardamento da votação.
Consulta pública debateu a proposta do feriado para a Consciência Negra |
“Eu quero agradecer os comentários dos
meus pares e dizer que promovi a consulta pública e acredito que, em qualquer
horário a que viéssemos marcá-la, teríamos dificuldades de trazer muitas
pessoas, porque elas têm afazeres e vidas atribuladas e, além disso, nós somos seus
representantes. Eu lamento o pedido de vistas do vereador empresário que usou o
mesmo discurso que ouvimos dos comerciantes: o problema da economia e o que o
feriado poderia acarretar de ainda mais prejuízo ao nosso país. Eu quero fazer
uma pergunta a todos: nós vamos esperar acabar a crise econômica para criarmos
o feriado para a consciência negra? Se sim, não vamos criar nunca”, afirmou.
O vereador recordou as grandes crises
econômicas em diversos países que abalaram o mundo. “Desde 1929, a principal
crise da bolsa dos EUA, houve uma série de outras nos últimos cem anos: 1994,
do México; 1997, dos Tigres Asiáticos; 1998, da Rússia; 2000, do Mercado.com; 2001,
da Turquia; 2002, da Argentina; 2007 a 2009, crise imobiliária norte-americana;
2010, da China, Portugal e Espanha; 2011 a 2013, com o pior período da crise e
agravamento na Grécia, Espanha, Portugal, Irlanda e Itália; da União Europeia
e, em 2014, crise da China. O que
estamos vivendo hoje vai acabar ano que vem? Vai acabar em 2017? Ou virá outra
crise? Não vamos votar por causa da crise? Estamos com medo de votar por causa
da crise e deixamos de reconhecer pessoas que foram arrancadas de suas
famílias, trazidas da África e que construíram esse país, porque senão
morreriam. E até hoje eles continuam pobres”, enfatizou.
O projeto foi aprovado por unanimidade em primeira votação há duas semanas |
Mauricio Tutty citou também uma
reportagem produzida pela rede BBC de Londres publicou que mostra um dado
assombroso: “Negros
são os mais ameaçados por crise econômica no Brasil, diz relatora da ONU” e
ainda “A pobreza tem cor no Brasil”. Diante desse cenário, questionou. “Então
por que estamos com medo de criar esse dia para nós nos rendermos,
reconhecermos o que de errado produzimos na história? Quanto vale um real? Vale
um real para quem recebe? Para quem paga? Mas quanto vale uma vida? Quanto vale
a vida do taxista que foi morto? Quanto vale as vidas que estão no presídio e que
são negros em sua maioria? Antes de falarmos de crise econômica, temos que
falar de crise humanitária. Eu respeito a opinião dos demais. Mas essa é a
minha. Se dependermos do fim da crise, não haverá feriado em PA e nem no
Brasil”.
Ao encerrar o seu pronunciamento, o
autor do projeto foi direto ao ponto. “Espero que o autor do pedido de vistas nos
traga durante a semana as pessoas, os argumentos, as motivações, além das que
já discutimos. Que o pedido não tenha o intuito apenas de atrasar a votação
para que não dê tempo de termos o feriado esse ano. Que ele seja de fato para
trazer novas revelações que não percebemos e que esse adiamento não seja apenas
um jogo político de desumanidade.
O
projeto
O Projeto de Lei nº 7098/2014 propõe a
criação do feriado para a Consciência Negra em Pouso Alegre como forma de
fomentar as discussões sobre preconceito, discriminação e outros problemas
sociais que perduram no país como um todo. No Brasil, mais de 1000 cidades já
contam a data em seu calendário municipal. Alguns estados foram além e
decretaram o feriado por meio de lei estadual.
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